A atenção foi descrita por Magill (2000) como sendo a "focalização, concentração da consciência" e quando se refere ao desempenho humano é associada a atividades perceptivas, cognitivas e motoras de habilidades. É um dos requisitos básicos para a coordenação e o controle motor. A falta ou déficit de atenção implica em danos a aprendizagem da linguagem, da escrita e das habilidades motoras.
Estudos como os de Danckert, Saoud e Maruff (2004), Pereira et al (2001) e Piek, (1999) com crianças portadoras de distúrbios leves no sistema nervoso central (déficit de atenção e/ou hiperatividade) e também com portadores de psicoses mais graves, (esquizofrenia), demonstram que a atenção afeta significativamente o desempenho motor de controle fino e global.
A coordenação motora de um simples movimento de agarrar um objeto, levantá-lo e colocá-lo de volta a mesa pode representar um árduo trabalho do sistema nervoso central (SNC). É necessário a participação de diferentes centros nervosos motores e sensoriais para a organização de programas motores e para intervenção de diversas sensações oriundas dos receptores sensoriais, articulares e cutâneos do membro requerido. As atividades necessárias para a execução do movimento incluem "ler" as propriedades físicas do objeto, buscar antigas referências sobre ele, mandar impulsos para os músculos aplicarem uma força determinada, contrair os músculos, parar de contrair vagarosamente, soltar o objeto no momento certo para ele não cair nem bater com muita força na mesa. Na criança, o êxito das atividades coordenativas em cada uma de suas etapas varia conforme o nível de aprendizado e a evolução do seu desenvolvimento motor (Rosa Neto, 2001).
Falhas na comunicação, causadas tanto por estímulos externos concorrentes quanto por distúrbios neuroquímicos, dos neurônios ligados à aprendizagem e à memória de longa duração, são as principais causas para os distúrbios motores em crianças compulsivas obsessivas e hiperativas (Carlsson, 2001). Estas falhas de comunicação dos neurônios causadas por estímulos externos concorrentes sugerem que, desde o planejamento até a execução de uma habilidade motora, um alto grau de atenção é requerido para que não ocorram influências negativas na realização da tarefa.
O controle motor fino está entre as habilidades que requerem mais atenção e concentração durante a execução, a precisão do movimento implica num aumento da preparação para o movimento. Prejuízo na prontidão contribui e fatores emocionais negativos interferem na resposta prejudicando o grau de atenção da pessoa (Magill, 2001).
Pereira et al (2001) mostrou que crianças hiperativas com alto grau de desatenção sofrem maiores danos no controle motor fino que crianças com menor grau de desatenção, estas, apresentando maior déficit na motricidade global, enquanto Goode (2002) mostrou o mesmo com os portadores de esquizofrenia comparados a um grupo controle.
A sinestesia corporal, que é a noção do próprio corpo em relação ao ambiente, está diretamente ligada ao controle motor fino. No entanto, no estudo realizado por Piek et al (1999), apesar das crianças hiperativas terem apresentado déficit geral nas habilidades motoras, não apresentaram diferenças sinestésicas significativas quando comparadas ao grupo controle. Foi sugerido com base nestes resultados que a atenção dificulta na execução das habilidades motoras mas não influencia na noção do corpo em relação ao ambiente. Ao analisar o resultado deste estudo, que foi realizado com crianças com idade entre 6 e 9 anos, sugere-se que o maior problema pode ter estar associado ao processo de maturação e ao distúrbio na área pré-frontal, pois os sistemas sensoriais não foram afetados, o que implicou em boa sinestesia, porém as crianças têm problemas de atenção e aprendizado motor que está relacionado a região frontal.
Considerando que a noção espacial, o controle óculo-motor e a consciência corporal têm papel importante na elaboração do plano e na execução do movimento pelo SNC, a atenção pode influenciar no controle motor por estar associada ao estado de vigília e ao feedback constante do gesto. Desta forma, o déficit de atenção implica em insucessos e em respostas abaixo das esperadas (Danckert, Saoud e Maruff, 2004). Para Brunnia (1999), o comportamento antecipatório e a atenção para o movimento (preparação) são realizados pelos mesmos caminhos, enfatizando mais uma vez o papel da atenção no domínio motor.
As habilidades de focalização nos estímulos sensoriais relevantes e de inibição daqueles irrelevantes ou interferentes são fatores críticos para a cognição. A atenção requer a habilidade de diferenciar entre estímulos relevantes e irrelevantes, de selecionar e focalizar apenas nas informações relevantes e de inibir as irrelevantes, dentro de determinado período de tempo (Määttä et al, 2004). Estudos como os de Booth et al. (2003) e Määtä et al, (2004) indicam que estes aspectos da cognição melhoram com a idade.
Desta forma, é necessário estudar a atenção sob dois aspectos: a atenção seletiva e a inibição de resposta. Estes aspectos fazem com que o indivíduo consiga focalizar sob o que interessa e ignorar os estímulos que não são relevantes, evitando assim distrair-se.
Mesulam et al. (1999) apud Booth et al. (2003) define atenção seletiva como uma alocação preferencial dos recursos limitados de processamento que se tornaram relevantes para o comportamento. O autor propõe um modelo neuro cognitivo para a atenção seletiva, onde três áreas corticais atuam em rede. O lobo parietal superior está envolvido na representação espacial exterior. O córtex pré-motor lateral atua nos movimentos de exploração e orientação (por exemplo, nos movimentos oculares). O giro cingulado anterior participa mais nos aspectos executivos da atenção seletiva, incluindo a monitoração da resposta (feedback).
As falhas em responder apropriadamente aos estímulos podem resultar de um déficit de atenção sustentada, bem como o erro de inibir uma resposta potencial. O modelo neuro-cognitivo de inibição das respostas elaborado por Mesulam (1999) apud Booth (2003) coloca 3 processos associados a 3 estruturas cerebrais. O primeiro processo diz respeito a inibição de uma resposta inicial pré-potencial, onde o córtex pré-frontal atua protegendo as representações de informações relevantes das interferências externas. O segundo processo é o de retenção de uma resposta potencial, onde há a participação dos gânglios basais provendo a inibição de comportamentos inadequados, sendo que o núcleo caudado e o putamen recebem os sinais do córtex frontal e os enviam a resposta de volta ao córtex via globo pálido e tálamo. Está rede, conhecida como "Rede fronto-estriada" modula a atividade na área motora suplementar que tem um papel primário no planejamento, iniciação e momento do movimento (Booth et al., 2003).
McCullagh e Weiss (2003) colocam que as crianças não estão completamente maduras na atenção seletiva, na velocidade de processamento visual e nos processos de controle antes dos 12 anos.
Com o objetivo de investigar o desenvolvimento da atenção seletiva, Määtä et al. (2004) compararam as diferenças entre adultos e crianças no processamento de atenção por meio dos potenciais relacionados ao evento. A amostra foi composta por crianças de 9 anos de idade e adultos. Os resultados indicaram que as crianças foram capazes de empregar os mecanismos de atenção seletiva quando processando um estímulo padrão, porém não conseguiram o mesmo com estímulos novos. A principal diferença observada foi que os adultos conseguiam manter a atenção por mais tempo que as crianças. Estas também se distraiam mais facilmente.
Visando investigar se o problema de atenção das crianças está mais voltado ao sistema seletivo ou inibitório, Booth et al. (2003) investigou as diferenças na atividade cerebral entre 12 crianças (idade entre 9 e 12 anos) e 12 adultos (idade entre 20 a 30 anos). A atividade cerebral foi investigada durante duas tarefas diferentes, uma que permitia a avaliação da atenção seletiva e outra que avaliava a inibição de estímulos. Os resultados indicaram poucas diferenças entre adultos e crianças na atenção seletiva. Porém, foram encontradas grandes diferenças na inibição de crianças e adultos, sendo que as crianças apresentaram maior ativação na região fronto estriada, incluindo o giro médio, cingulado e frontal. As grandes diferenças em resposta a tarefa de inibição são consistentes com a maturação demorada ou prolongada da região fronto estriatal.
Considerando o papel essencial das emoções e da memória na atenção, e a importância da atenção na aprendizagem, destaca-se aqui a importância do significado no processo de aprendizagem. A memória está associada ao sistema límbico que está fortemente ligado as emoções. Tendemos a armazenar o que nos é emocionalmente relevante, ou importante para a sobrevivência. Pela associação do lobo límbico com o córtex pré-frontal, tendemos a programar e planejar baseados no que sentimos e no que nos foi passado, pois essa região frontal é responsável pela nossa subjetividade, valores e significados. Por isso melhor aprendemos o que nos é relevante e tem um significado. Construímos e planejamos o movimento baseados nas nossas motivações e valores e o aprendizado, desde a primeira reação ao estímulo, depende disto. Como o aprendizado depende da atenção, e esta está associada com aquilo que nos é importante, o significado influenciará no grau de atenção (Gray et al., 2003).
Qualquer distúrbio que venha a modificar o funcionamento normal do sistema límbico pode prejudicar a atenção, um deles é a ansiedade. Um estudo de Terelak (1990) encontrou relação entre a ansiedade e a aprendizagem motora. No caso da ansiedade traço, ou seja, a ansiedade que faz parte da personalidade da pessoa, ela foi relacionada como um dos indicadores para a eficiência da tarefa psicomotora. Também foi encontrado que a ansiedade-estado, ou seja, a ansiedade momentânea, tem um efeito negativo na coordenação óculo-manual numa tarefa de aprendizado.
De acordo com a teoria social cognitiva desenvolvida por Bandura, 4 processos governam o aprendizado: a atenção (seleção adequada), a retenção (representações cognitivas já existentes), a produção (escolha próxima ao modelo retido) e a motivação (regula a eficácia dos anteriores). Segundo Bandura (1997) apud McCullagh (2003) as crenças de auto eficácia fornecem a maior base para a ação e podem influenciar na escolha da resposta, no esforço e na persistência para atingir os objetivos.
Uma percepção de competência baixa e a auto-estima abalada em crianças e adolescentes com déficit de coordenação também podem prejudicar a aprendizagem aumentando a ansiedade e reduzindo o estado de atenção (Skinner e Piek, 2001).
Ao investigar as estruturas corticais, pode-se observar a relação entre sistema sensorial e motor, entre a maturação do córtex de associação e as etapas do desenvolvimento.
Destacou-se neste estudo a relação entre atenção, maturação frontal, aprendizagem motora, de forma a evidenciar a importância do desenvolvimento do córtex pré-frontal na aprendizagem e eficiência motora. Considerando que o córtex pré-frontal é o grande responsável pela consciência do eu, pela estruturação social de valores e significados pessoais e está intimamente relacionado à história do indivíduo, destaca-se a participação e a importância da subjetividade no planejamento e execução dos movimentos. O desenvolvimento do movimento se diferenciará de acordo com a intencionalidade, que é equivalente ao planejamento do movimento estruturado no córtex pré-frontal, mediado pelos valores e história do sujeito.
Dado o grau de complexidade, a área pré-frontal é a última a ser totalmente mielinizada, sofrendo assim um grande impacto das experiências pessoais na sua construção. A eficiência do movimento depende em grande parte desta estrutura, por isso os movimentos especializados e complexos que exigem muito desta função executiva, evoluem gradativamente conforme a maturação desta área e de acordo com a história do sujeito.
- FONSECA, Vitor da. Da filogênese à ontogênese da motricidade. Porto Alegre: Artes Médicas, 1988. 309 pp.
- FONTES, Martins. A criança dos 5 aos 10 anos: Arnold Gessel. São Paulo: Livrarias Martins Fontes, 1987. 403 p.
- ROMANELLI, E.J. Neuropsicologia aplicada aos distúrbios de aprendizagem: "Prevenção e Terapia". Temas em Educação II - Jornadas 2003, 2003
- ROSA NETO, Francisco. Manual de avaliação motora. Porto Alegre: Artmed, 2002. 136 p.
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